quinta-feira, abril 14, 2005

Um novo paradigma para a escrita


Segundo o dicionário, escrever é "representar (língua, pensamentos) por sinais gráficos".

A definição corrobora com minha percepção: julgo que a escrita é um link direto para o estado cognitivo e emocional de uma pessoa ... e o melhor de tudo, assíncrono.

Como pode então estar caindo em desuso?

Falo por experiência própria. Adoro escrever, mas fazia anos que não escrevia tal como tenho feito neste espaço. Por quê? Boa pergunta... coisas da vida moderna e de adulto (tem uma pergunta que eu sempre quis fazer aos meus professores de português: Quando foi que escreveram a última redação? )

É maravilhoso perceber que quanto mais escrevo, mais aprendo. Sempre foi assim (desde o tempo das colas na escola - colas que, em sua maioria, depois de minuciosamente preparadas acabavam nem sendo utilizadas).

Ao meu ver seria magnífico as escolas usarem extensivamente a escrita e a criação como avaliação! Isto é algo muito muito estimulante (e sim, considero que poderia ser muito estimulante para todos, desde que trabalhado adequadamente). Até onde sei, o construtivismo carrega isto em sua essência.

Acredito que esta não é uma idéia nova ... julgo que foi assim que tudo surgiu. Não sou um estudioso, mas arrisco a dizer que muito provavelmente, em algum momento do passado, alguém percebeu que era necessário tornar tudo "menos escrito" para massificar o ensino. Vieram as questões objetivas para massificar as avaliações. Inventaram a pós-graduação para poder massificar o mestrado e doutorado (sem ser necessária a tese, basta estar de corpo presente - e bem parecido com a escola e faculdade. Pelo menos, neste caso, trocaram o nome).

Para não regredirmos (ter menos pessoas com acesso a educação), ou teríamos que multiplicar os professores (e depois enfrentar o problema do despreparo dos mesmo), ou criar uma criar algo novo conceitualmente. Temos o construtivismo que vem enfrentando este dilema, pois busca suprir as necessidades sistêmicas do aprendizado, sem todavia conseguir ganhar espaço (necessita da multiplicação do número de professores e na qualidade dos mesmos. O que estamos vendo acontecer é a elaboração de um Construtivismo Frankstein, com objetivos puramente na área comercial e de marketing, que acabam piorando ainda mais a situação dos alunos, que ficam desasistidos e mais perdidos que cego em tiroteio).

Os exemplos de avaliação baseada na escrita que temos hoje, para mim, são mais contra-exemplos que do qualquer outra coisa. Para falar rapidamente: um sistema equivalente ao utilizado para o mestrado e o doutorado, além de tolhir o pensamento, faz com que o conhecimento seja especializado; a disciplina de português olha os acentos, pontuação e coerência - muitas vezes a coerência é deixada de lado; questões descritivas são pontuais e normalmente exigem um simples "copy & paste" mental da resposta do livro/caderno/quadro; etc.

A deficiência na "escrita" passar de forma desapercebida/complacente pelos professores é algo que tem consequências graves para o futuro destas pessoas e da comunidade (prefiro comunidade que sociedade, é mais intimista). Eu poderia fazer uma tese que existe correlação positiva entre "saber escrever" e a consciência, o pensamento sistêmico, a organização de idéias, a capacidade de se expressar e se fazer entender, etc... até mesmo a definição de dicionário nos mostra isto, afinal de contas, basta fazermos o caminho inverso, e da escrita chegaremos ao pensamento e a língua da pessoa.

As aspas no escrever é pelo fato que, talvez em um novo paradigma, um analfabeto possa "saber escrever". Hoje "saber escrever" esta relacionado a alfabetização e é encarado como parte dela, ou ainda, restrito a ela, deixando de lado todo o potencial que esta manifestação pode trazer, em suas mais diferentes formas. Quem irá escrever com lápis e papel ou teclado daqui 10 anos ou 20 anos? Quais serão os "sinais gráficos" que o dicionário se refere daqui 30 anos? Será que estaremos registrando tudo em voz, vídeo, hologramas, etc? Isto será "escrita"? A leitura manterá sua importância se a escrita, tal como existe hoje, vier a mudar? É justificado o peso que damos a leitura quando comparado com a escrita? Um equilibrio de importância não se faz necessário? Será que criaríamos mais se lessemos menos e escrevessemos mais? E aprenderíamos mais também? Como fica a relação de leitura e escrita em tempos de google?

Não tenho claro qual o novo paradigma, e talvez não tenha muito claro qual o paradigma a ser superado, visto que os textos saem de rompante. Ainda assim, urge fazer a escrita transcender o dicionário.

Mas julgo que chegaremos a um ainda nos "comentários" deste Post ...


3 Comments:

Blogger Gustavo said...

Seu Messa, seu Messa o que tu anda fazendo? Saindo da mesmisse tu acaba forcando os outros a se sentirem desconfortáveis, impelidos a se lancarem ao desconhecido, ao novo, ao diferente! As pessoas nao querem isso, as pessoas querem estar certas o tempo todo ou, no máximo erradas como "TODO MUNDO"! Essa coisa de "exército de um homem só" é coisa que acabou com a morte do Brizolla (nao concordava com ele mas o respeitava). Nao temos mais caudilhos, precisamos deles mais do que nunca e entramos num paradigma: ninguem quer sê-lo!

Mas voltando ao assunto: a escrita.

Quem quer ler? E quem quer escrever, quando podemos ver um filme (hehehe). Será que estamos caminhando para uma socidade do culto à ignorância? Já estamos na sociedade do "agora" ou do "já". Estamos na sociedade dos clássicos de estante (eu mesmo tenho alguns) ou das obras "para mostrar para as visitas"? Quanto ao ensino acho que estamos o ápice do era dos "colecionadores de certificados", nao interessando o que isto significa: "sou mestre 'nisso'", "doutor 'naquilo'", "engenheiro no produto 'sei lá das quantas'", "gold 'alguma coisa'".

Ninguem mais esta interessado nas perguntas: "o que tu sabe?", "o que tu aprendeu?". Uma pena pois estamos voltando a um regime militar onde o importante sao as tuas "medalhas", tuas "condecoracoes". Mesmo que elas só demonstrem que tu é um total e completo ignorante (no sentido original da palavra).

Mas chega de divagar, acabei usando esse post para colocar algumas das minhas idéias, numa infantil tentativa de tentar contribuir com alguma coisa achando que isso tem alguma relevancia. Mas tá aí :-)

15 de abril de 2005 às 04:01  
Blogger Iris said...

Oi, Messa

Parece que os blogs (dentre outras ferramentas da web), recolocam a escrita em seu contexto natural - a comunicação. Na escola escrevemos sob demanda, sem possibilidades de eleger o tema sobre o qual nos interessa escrever, de "dar um tempo" para amadurecer idéias, sem pausas para um distanciamento que possibilite retomar e rever o próprio estilo e a clareza do escrito. A finalidade é outra: "mais tarde podes escrever sobre o que quiseres, agora escreves para aprender a fazê-lo corretamente, para que possas ser corrigido enquanto é tempo e antes que teus "erros" fixem em tua memória".
Isso não é escrever, não há comunicação possível e mata o destino da escrita, na origem.
Abra@os, Iris

18 de abril de 2005 às 17:06  
Blogger Beatriz said...

Oi Messinha,entrar no teu blog é saber que vai ter que esquentar as sinapses!! E eu adoro isso!!
Realmente fizestes um belo retrospecto, com algumas colocações muito bem pontuadas pela clareza e originalidade das relações.Vou aumentar um pouco o raio de discussão
A Iris já pontuou que a leitura e a escrita ligam-se visceralmente ao comunicar-se, que, por sua vez, está tb intimamente ligado ao momento em que a sociedade está vivendo. Assim me parece que, qdo esse momento muda, seja pela tecnologia criada, pelo conteúdo construido, pelas ferramentas à disposição, pelos paradigmas que se dão lugar a outros, muda, além do conteúdo a forma da comunicação. E se pensarmos assim, não mudam os sistemas de códigos? será que uma nova lingua escrita não está aparecendo?
Ontem mesmo, assisti um filme na TV cuja legenda era com cibermovie ou seja, toda escrita com a linguagem atual de comunicação na internet.
De qualquer jeito, a lingua evolui,mas o caminho não desaparece. Sempre haverá lugar para os clássicos!! Mas, talvez, em hora mais apropriada. Meu marido está se deliciando com os clássicos brasileiros e diz que agora ele está pronto para isso. Será que ler esse tipo de livro no Médio ajuda a desenvolver o gosto pela leitura?
Para mim, voraz leitora de todos os tempos, lembro sempre de ter começado minha vida de leitora, na cama, antes de dormir, com uma revistinha do Pato Donald e a Tico-Tico ( revistinha do meu tempo)
Um abração
Bea

20 de abril de 2005 às 14:13  

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